Ninguém


Por tanto tempo, a menina sentada na janela espera...
Lá fora, outono. Folhas no jardim e um balanço que o vento fresco empurra de leve. Ninguém. Algumas folhas ousam e rodopiam pela grama... e o balanço no seu pendular lento e persistente. Ninguém. Na janela, a menina espera... O relógio da sala badala anunciando um tempo... qualquer tempo... De vez em quando, um saco plástico voa pelo jardim... Em outros momentos, algum papel de bala se atreve e passa por ali também. É tudo tão calmo e harmônico no jardim. Música. O balanço e o rodopio das folhas se confundem com o badalar do relógio. É a cena de um musical sem música. Mas tem algo descompassado no meio de toda essa harmonia. Sim. As batidas do coração da menina que espera na janela não se encaixam na cena... Batidas rápidas, curtas! A menina sabe que está fora de lugar... ela sabe! "Talvez se meu coração parar de bater, a cena possa voltar ao seu compasso lento e calmo".
A menina vai até o jardim, senta no balanço, baixinho pronuncia algumas palavras soltas e espera... Lentamente, o coração da menina diminui seu ritmo... "Vai parar de bater logo"...
Dentro da casa, espalhados, pelo chão da sala, comprimidos... o frasco, centímetros dalí...
Lá fora, as folhas continuam a rodopiar... a menina, imóvel, encostada na corrente do balanço que pendula devagar... Agora sim... Agora sim a cena está como devia. O silêncio agora é harmônico em sua plenitude!
O espetáculo segue por toda a tarde, até que o cair da noite fecha as cortinas. Ninguém.

(Raquel Zichelle - 10/05/2009)