Clara

Clara estava deitada debaixo duma árvore. O dia estava quente, agradável. Algumas folhas tecidas com as flores a cercavam. Usava um vestido leve, branco. No cabelo, uma linda rosa fora colocada sobre o grampo que prendia os lindos cachos dourados. Estava descalça... gostava de sentir a grama tocar seus pés. Seu semblante era tranqüilo, estava em paz... e feliz! Observava tudo ao seu redor com satisfação, tudo em perfeita harmonia. Logo, viu uma intrigante borboleta pousar sobre a grama. Depois, com a leveza típica das borboletas, levantou vôo e começou a rodear Clara. Parecia que a estava chamando, querendo lhe dizer algo. Não demorou muito para Clara ter a mesma sensação. Pôs-se em pé! A borboleta, satisfeita, saiu voando, formando um caminho no ar e Clara a seguia. Estava agora maravilhada, hipnotizada pela leveza do vôo da borboleta. A menina esticava o braço para tentar pegá-la, mas era inútil. A borboleta não era real. Era feita de sonho. E se desfez assim que Clara se deu conta. Mas antes que pudesse esboçar algum sinal de tristeza, surgiu uma pequena nuvem rosa, parecia um algodão doce. Rapidamente, Clara se encantou. Ficou olhando fixamente para a nuvenzinha. Os olhos cresciam e brilhavam enfeitiçados. Nem percebeu a imensa rede que se aproximava. Se assustou quando a rede engoliu a nuvem e saiu em disparada. Sem pensar, saiu correndo atrás. E quando perdeu o fôlego, se desesperou. Para onde teriam levado a nuvenzinha? Já perdera a borboleta, não podia deixar que acontecesse o mesmo com a nuvem rosa. Seria ela feita de sonho também? Não podia acreditar nisso, caso contrário, a nuvem também sumiria. Preferiu acreditar que era feita de algodão doce mesmo. Sentiu gotas d'água molharem seu rosto, imediatamente olhou para o céu e para sua surpresa, lá estava a nuvem, presa onde era seu lugar. Clara se sentiu triste. As gotas eram lágrimas. A nuvem estava tão distante. Não podia tocá-la. Não podia senti-la entre seus dedos. Por mais que pulasse, nunca a alcançaria. E doía em seu coração ver a nuvem presa, chorando! Queria libertá-la! Fechou os olhos bem apertados, passou a acreditar que a nuvem era feita de sonho. Abriu os olhos lentamente, não sentia mais as gotas, a nuvem tinha se desfeito. Clara permaneceu ali, olhando fixamente o céu que agora parecia descer. Surgiu no céu um pequeno ponto luminoso. Pensou ser uma estrela. Mas conforme o céu ia descendo, a luz ia ficando maior e mais intensa, não se tratava de uma estrela. O que seria? A luz cada vez mais forte, agora a cegava. Clara estava deitada sobre a cama. Os lençóis brancos. Ao seu lado, outras camas iguais. Do quarto, podia-se ouvir o movimento nos corredores. O entra e sai de gente. A menina vestia uma camisola. Os cabelos ondulados, sem vida. O rosto pálido, o corpo estirado na cama, sem força. Em seu sangue, o soro! Seus olhos espelhavam desalento. Já nem sabia mais quanto tempo estava naquela cama. Só conseguia pensar na borboleta e na nuvem rosa. Pensava nelas todos os dias. Sentia as gotas escorrerem pelo seu rosto e via a borboleta se desfazer, mais uma vez e outra... e outra. Era assim que contava o tempo. Até que a borboleta não se desfez mais e as gotas cessaram! Os lençóis brancos estirados! A cama vazia!



(Raquel Zichelle, 09/11/2007)